Lágrimas
se juntavam à água do chuveiro que escorria em suas costas. Ela precisava desse
banho. Ou achava que precisava. Na verdade, ela tinha a necessidade de se
libertar. Respirar fundo, deitar na cama e dormir tranquilamente era um
privilégio que ela não desfrutava há meses.
Ele
entrou em seu cérebro como uma substância alucinógena. Ela provou uma, duas,
três vezes e não conseguiu evitar: viciou-se. Ela mesma não entendia como, mas
era mais forte que sua vontade. O cheiro, a pele, o calor, o toque, a voz, o
beijo, o gosto, tudo era incrivelmente único, só dele – e dela. Era um
relacionamento que se tornou obsessão. Ele veio, rápido, rasteiro, deu um
beijo, fez amor, e se fez marcar na memória dela.
Como
um veneno, ele se espalhou e ela podia jurar que sentia a textura de sua pele
nas mãos, mesmo ele estando longe. Ela sentia seu perfume em todo lugar, ouvia
sua voz em qualquer música, o queria a qualquer momento. Se o propósito era
esse ou não, ninguém sabe. Não há como saber. Mas ele a drogou de si mesmo e
saiu. Uma noite, um lençol, uma cama, dois corpos. Levantou, vestiu-se e
caminhou porta afora.
Ela
viu, mas achou que era um sonho. Afinal, estava completamente ‘chapada’ dele. Então
percebeu que não era sua imaginação. Ele realmente foi embora. E seu vício?
Como ficaria sem a droga à qual ele a apresentou? Impossível, talvez. Disseram
que se ela tivesse força de vontade, conseguiria manter-se ‘limpa’, mas ela não
queria. Não queria mais pensar nele. Se não era mais possível saciar sua sede,
queria-o longe de sua vida. Mas não conseguiu mais viver.
A
água do chuveiro estava morna e, misturada às lágrimas e ao sangue, escorria em
seu corpo. Os cortes estavam visíveis em seu corpo nu e sua pele clara já
perdia o brilho. O vício não a soltou. Mas ela esqueceu que aquela obsessão não
era boa ou ruim, era apenas uma parte de sua história. E ela sabia. Já aprendeu
em outras partes de seu mundo, com outros cheiros e bocas, mas só pensava nele.
O vício era saudável enquanto era bom para os dois. Quando ela deixou de ser
seu maior e mais inquietante desejo, ele tratou-se e deixou de usar sua droga.
Ele precisava de outra substância. Ela também. Mas ela não conseguiu. Ela não
entendeu. Ela não lembrou.


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