Ele
continuou me olhando. Fixamente. Não entendi o motivo da surpresa estampada em
seu rosto. Ele estava assim havia alguns minutos. Estávamos sentados à nossa
mesa preferida em um lindo restaurante, conversando e acertando alguns detalhes
do nosso jantar de noivado, previsto para o mês seguinte. Enquanto eu explicava
sobre vestidos, decoração e conferências antes do jantar, algo apitava
intermitentemente. E me interrompia sempre.
Toda vez
que o celular apitava, ele olhava, digitava alguma coisa e voltava a me
encarar. Às vezes, ele realmente parecia prestar atenção. Outras vezes, ele só
olhava o celular, a espera de mais um apito. E foi quando, após outro apito,
ele pegou o aparelho, sorriu e digitou alguma coisa que minha paciência chegou
ao limite.
Era uma
noite fresca. Todas as janelas do restaurante estavam abertas e nossa mesa era
muito próxima às janelas. No próximo apito do celular, antes que ele pudesse se
mexer, peguei-o e, num movimento rápido, joguei-o pela janela. Depois voltei
minha atenção ao meu noivo. E ele fixou seus olhos nos meus, boquiaberto, quase
em choque. Algumas pessoas também olharam em minha direção, ainda mais quando
um carro passou por cima do celular, mas logo voltaram às suas refeições.
Namoramos
há cinco anos. Ele sempre foi meio distraído, mas nunca tanto quanto hoje,
nunca tanto quanto depois de ter comprado essa porcaria de celular. Se quiser
usar antes de dormir, após as refeições, não tem problema. Comigo, pelo menos.
Mas estamos falando do nosso noivado, é nossa festa, é nosso futuro.
De repente,
ele começou a fazer um escândalo. Sim, parecendo uma criança contrariada. Eu
ouvi sem prestar atenção. Perguntou se estou louca, se acho que dinheiro nasce
em árvore, se penso que ele pode ficar sem celular. Não respondi a nenhuma
pergunta. Deixei-o esbravejar, xingar, espernear, como se deixa uma criança
gritar e chorar até que canse. Ele cansou também.
Sentou-se,
apoiou a cabeça nas mãos e disse que não aceitaria isso. Não aceitaria ser
noivo de alguém que joga seu celular pela janela. Eu ri. Mas eu ri tanto que
dei gargalhadas. Eu sabia da sua traição. Ele estava me traindo com uma colega
de trabalho. E falei para ele que eu descobri tudo. Pensei em vingança, mas eu
o amo e não é o caminho que eu quero seguir.
“Se somos feitos um para o outro? Não, acho que não somos. Mas
construímos uma vida até hoje e eu não quero abrir mão dela. Espero que você
reconsidere”, eu disse.
Levantei,
saí do restaurante, chamei um táxi e fui para casa. Dois dias depois, ele me
ligou algumas vezes. Eu estava chateada. Não queria mais ser traída, mas
realmente o amo, e sei que ele me ama. Não é questão de perdoá-lo ou não. É
questão de escolha. Eu o quero. Sem precisar repensar. Quando, por fim, atendi
sua ligação, ele pediu perdão e pediu que eu o encontrasse no parque.
Quando
cheguei, ele estava com um buquê de flores nas mãos, um sorriso maravilhoso no
rosto e, ajoelhando, me pediu em casamento mais uma vez. E, novamente,
previsivelmente, aceitei. Afinal, nos amamos. E o celular novo dele é bem mais
simples. Faz apenas ligações. Preferencialmente, para mim.

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